segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Aborigenas

Encontramo-los á beira das estradas, de caminhos ou encostados a um canto qualquer nas ruas movimentadas. Olham-nos com um ar estranho, como quem espera acordar de um sonho. Por vezes quando os olhares se cruzam sorriem e erguem a mão lentamente como cumprimento. Mantêm-se afastados como se presenciassem algo que não compreendem ou em que não querem participar. Ignoramo-los, incomodados. São como fantasmas errando por uma terra que já foi sua, a meio caminho entre o passado e o presente. Continuamos, atarefados, com as nossas lógicas mesquinhas, raramente parando para observar e recusando o contacto de quem nos observa.
No fundo temos medo de perceber que aquilo que nos parece lógico não faz na verdade nenhum sentido.

:)

domingo, 10 de maio de 2009

Facimme a muina

"Facimme a muina" é um comando da tradição naval Sicilina. Remonta ao tempo do reino das duas Sicilias e era utilizado aquando da inspecção naval por uma figura importante. Ao ouvir o comando os marinheiros que se encontram na esquerda da embarcação devem movimentar-se para o lado direito e os do lado esquerdo para o direito. Os marinheiros que se encontram na parte de trás do navio para a parte da frente e os que estão á frente para a parte de trás. (Poupo os termos de estibordo, bombordo, proa e popa porque nunca os saberia identificar numa embarcação). O Objectivo desta movimentação é o de criar a ilusão de que todos se encontram ocupados com alguma coisa. Uma coisa muito Italiana, sem duvida.

Nos ultimos tempos tenho-me interrogado frequentemente se não andará mais de meio mundo entretido com esta coisa de andar de um lado para o outro a fingir que anda a fazer qualquer coisa. O Dubai é o sitio perfeito este tipo de observação. De facto, não são necessaŕios binoculos, silencio absoluto ou mesmo qualquer camuflagem ou existência de torres de observação. Basta parar num café e olhar a volta. A observação mais cuidada e o contacto directo confirmam as suspeitas.

A Maior parte da população vem para aqui para ter uma vida melhor. Acabam entretidos com qualquer coisa uma serie de anos a fio esforçando-se para sobreviver num ambiente que não é o deles, num aparente conforto que jamais poderiam alcançar na sua terra natal. O Mesmo se aplica aos expatriados ocidentais, embora noutra escala. Quanto tempo é que isto dura não se sabe muito bem. Para alguns é para o resto da vida, para outros é por uns anitos e para alguns que raramente temos o prazer de conhecer é pelo menor tempo possivel. Eu, confesso, faço parte destes ultimos.

Agora as coisas estão a mudar. Já não se faz dinheiro como antes e as construções começam a parar. Diz-se que 80% já parou... As pessoas começam a sair do pais e a abandonar o carro no aeroporto com uma nota de desculpas no para brisas. O Desemprego é real. Começa-se a recear o crime apesar do corpo policial local garantir que algumas coisas não acontecem no Dubai. Sim, se lhe roubarem o pneu no parque de estacionamento prepare-se para confessar que foi você que roubou o proprio pneu porque essas coisas não acontecem no Dubai. Se fôr violada então provavelmente vai ser acusada de assédio sexual porque essas coisas não acontecem aqui... Enfim, de repente o sonho já não é assim tão côr de rosa e as coisas parecem assumir uma outra forma em que nunca se tinha pensado muito bem antes. De qualquer forma o Dubai não é assim tão diferente no que toca ao comportamento humano do que o resto do mundo. O que, dito de uma forma simples, me parece absolutamente assustador.

Assustado ou não, tive um sonho no outro dia que me parece interessante. Sonhei que me encontrava algures a ver um qualquer espectaculo ao vivo em que existia um fato de macaco em cima do palco.
Nisto, alguém sobe ao palco e aproxima-se calma e vagarosamente do dito fato e veste-o. De seguida começa a saltar de um lado para o outro como um verdadeiro simio. Nesta altura, o publico, onde eu me encontrava, começa a rir desmesuradamente perante o ridiculo da situação. Pois é. De uma forma ou outra todos nós vestimos o raio do fato do macaco. Por vezes nem nos apercebemos, outras, quando nos apercebemos, já é tarde de mais e por razões que por vezes nem compreendemos muito bem. Vamos fazendo esta coisa de andar de um lado para o outro e perdemos a noção daquilo que nos é verdadeiramente importante. Inventamos mil subrefugios que nos ajudam a tornar complexo aquilo que é simples. Chamem-lhe "Ocidentalização do planeta" ou aquilo que quiserem. O Mundo hoje é assim. Não sei se alguma vez terá sido de outra forma, mas posso imaginar que sim. De qualquer forma e por favor: "Keep it Simple!!"

Pela Simplicidade. :)

domingo, 11 de janeiro de 2009

As curtas memorias de um recém-emigrado.

Fim de mais uma etapa. 3 meses e meio depois regresso a Lisboa. A "Dubai experience" esteve quase a levar a melhor. Já não consigo ver um "monhé" a frente que fico com uma vontade incontornável de lhe passar por cima com um cilindro daqueles de alisar as estradas. Algo engraçado, até porque acho os locais daquele sitio perfeitamente incríveis na forma simpática e amigável como tratam as pessoas. Infelizmente são menos de 10% da população... Para trás fica a "Dubai experience", ou pelo menos a primeira parte desta. Para trás ficam, entre outras coisas, e para que não me esqueça de mais algumas:

- Tirar a carta de condução dos Emirados com um instrutor indiano que diz que não faz mal se não olhar para a frente antes de mudar de faixa “...são só 3 segundos...”
- Demorar um dia inteiro na inscrição para a dita licença, algo que só foi possível depois da intervenção do gerente porque precisava de 4 lições e eles só vendiam 8...
- Andar a saltar de “counter” para “counter” e após a 5ª tentativa frustrada ser enviado de volta para o primeiro...
- Estar num bar a ver um dos fogos de artificio mais caros do mundo, na inauguração de um hotel numa ilha artificial qualquer em forma de palmeira, e após os primeiros 5 segundos achar que aquilo afinal não tem piada nenhuma. Após 1 minuto ter a certeza de que toda a gente pensava o mesmo porque já ninguém olhava para a coisa, apesar desta continuar...
- Ir a um festival de cinema em que o filme começava meia hora depois do que estava no programa, que era diferente do que estava no site oficial, e que começou mesmo assim 30 min. atrasado.
- Ir a um festival de cinema e entrarem vários fulanos com tabuleiros com bifes e hambúrgueres para comerem durante o visionamento que claramente pensam que o balde de pipocas é para meninas...
- Ir ver 3 filmes a um festival Internacional de cinema e nenhum ter começado a hora prevista.
- Transportar álcool ilegalmente através do emirado de Sharjah ás 4 da manhã, completamente perdidos, enquanto parávamos o carro para perguntar as pessoas “-Wich way is Dubai?”
- Ir a um jogo de Paintball e não perceber que já tinha acabado e continuar escondido procurando o inimigo porque o empregado indiano tinha uma pronuncia incompreensível.
- Ser obrigado a usar um fato num Kartodromo por medidas de segurança e os capacetes não terem viseira.
- Estar 1h30m á espera de um táxi numa fila de um centro comercial, depois de 1h de tentativas falhadas de parar um táxi sem passageiros na rua.
- Ver passar um autocarro que não parou na paragem, após ter decidido ir de autocarro porque os táxis não paravam quando lhes fazia sinal...
- Ir repetidamente comer a uma cadeia de fast-food em que o empregado diz sempre que são 6 minutos, mas é sempre mais tempo e não achar estranho.

Bom, de regresso no Natal, noto que o multibanco mudou.Talvez por causa dos assaltos o bonequinho aparece agora já de mãos no ar, ao jeito mais tradicional do “mãos ao ar!” ou “stick'em up!” dos filmes de Hollywood. Vejo um cartaz com o papá a oferecer uma prenda a filha querida, nas proximidades de uma árvore natalícia e que pergunta ternamente á catraia “-O que é que se diz?”. Ao que esta responde prontamente “-Fónix!!!”. Não sei se inspirados por esta coisa, a faixa de Gaza incendeia-se por esta altura e a tragédia continua. Triste, muito triste mesmo...
Por cá Fala-se no Magalhães, o amigo numero um de qualquer assessor que se preze, e do Cristiano Ronaldo, que espatifou um Ferrari e faz honras de abertura nos telejornais. Resumindo, mais uma vez, nada de novo no pais a beira mar plantado.
De qualquer forma tinha saudades de Lisboa. Saudades de ir ver uma banda qualquer tocar, ir ver um filme, beber uma cerveja descontraidamente...

Agora vou de volta. Apesar de tudo sinto-me mais optimista, talvez porque comece a sentir frio por aqui. Talvez porque estivesse simplesmente cansado. Na verdade, não sei muito bem porquê, mas espero que dure, até porque agora vou ter de tirar o BI dos Emirados... :)


Blur - Parklife por EMI_Music