domingo, 5 de outubro de 2008

Eid

Acabou o Ramadão. Para comemorar fui almoçar a um restaurante com janelas para a rua. Nos primeiros dias a sombra persegue-me e hesito antes de comer ou beber agua em publico. Olho a volta e certifico-me de que há pessoas a fumar e de que os restaurantes estão abertos. Oiço musica na rua e apercebo-me de que é a primeira vez que tal acontece. Aparentemente a vida volta ao normal. Os restaurantes abrem portas durante o dia. Ha pessoas na rua, que comem bebem e fumam despreocupadamente. Estamos no Eid.

Os descontos de ramadão transforma-se em promoções do Eid e a primeira vista a cidade começa a ganhar alguma vida. A “Timeout” apresenta um modesto calendário de eventos, incluindo concertos e a habitual panoplia de DJ´s internacionalmente conhecidos na terra deles.

Após um mês começo a aperceber-me de que me afastei da realidade. Na rádio as noticias resumem-se ás ultimas coscas de hollywood e as ultimas glorias de bollywood. Os colunaveis mantêm a populaça entretida com os ultimos desenvolvimentos das suas vidas de sonho. Pelo meio e em honra da vasta população Indiana noticia-se o rebentamento de mais umas bombas na India. Para além disto o mundo resume-se as glorias de mais umas enormidades do emirado. Desta vez abre o Atlantis, um aquaparque com uma queda de umas dezenas de metros de uma piramide supostamente mesopotâmica para um lago com tubarões, através de um tubo, claro, porque isto de nadar com os bichinhos não era bom para o negócio. As coisas querem-se bonitinhas e de fácil consumo. É como subir uma montanha de elevador.

Ao mesmo tempo e no meio disto tudo, a rádio pede cautela com os banhos de praia, uma vez que algumas foram decretadas improprias para consumo na sequência de descargas ilegais de esgotos no mar. Aqui os esgotos vão para um tanque de onde são recolhidos por camiões cisterna. Acontece que o sistema municipal de tratamento de esgotos está saturado e os ditos camiões cisterna chegam a passar 18h em filas a perder de vista no acesso ao local de descarga. A miuda na rádio aconselha também que não se ferquente o local onde os ditos camiões fazem a cisterna, uma vez que os mesmos fazem corridas para o acesso ao local e, sabendo que a maioria dos condutores aqui são Indianos ou Paquistaneses, não é dificil de imaginar a coisa ou compreender as descargas no mar.

Fiquei também a saber que deixou de ser possivel a pessoas solteiras o alguer de moradias e as mesmas estão a ser despejadas das suas casas. As moradias são só para familias. Quem é solteiro que vá morar para um apartamento. Pelo menos sempre há mais pessoas e assim talvez dê o nó com alguma vizinha ou vizinho e depois já podem ir para uma moradia. Esta medida tem a ver com a partilha excessiva deste tipo de habitação por residentes. Não compreendo muito bem a coisa, porque se 40 pessoas partilham uma moradia a unica razão que considero plausivel para não partilharem um apartamente é a possibilidade de fisicamente tal não ser possivel.Vem-me sempre a ideia aquela coisa das 47 pessoas dentro de um mini. Mas isso não é problema. Aqui há fiscalização e os tipos encarregam-se de ir á casinha e ver quem é que lá mora, afinal de contas os emirados são um pais livre. O conceito de liberdade é que é subjectivo.

O Dubai é um sitio agradável, apesar do clima agreste. Há uma multiculturalidade interessantissima e mais uma vez reconheço que tenho admiração pelo que os governantes desta terra fizeram dela. Embora a direcção seguida não faça muito o meu genero, construiram qualquer coisa. Melhoraram o bem estar da população, e tudo isto no meio do deserto. Claro que há dinheiro para o fazer, mas vai lá dizer isso ao José Eduardo. Tomaram a opção de distribuir a riqueza e tornar a coisa sustentável, embora a sustentabilidade seja algo discutivel. A verdade é que os Emirados tornaram-se em poucos anos uma potencia na zona. Vive-se confortavelmente e há segurança na rua. Aqui deixa-se o BMW aberto e a trabalhar no meio da rua enquanto se vai a casa buscar algo que ficou esquecido e, surpresa das surpresas, ainda lá está quando se volta. Deixa-se o portátil no carro o dia todo, a carteira, o que quer que seja e ninguem parte um vidro. Na verdade pode até deixar-se o carro destrancado. Algo a que eu ainda não me consegui habituar.

Estou aqui há um mês. Sinto falta de uma esplanada onde possa beber um copo na rua. De ver um filme que não seja uma palhaçada americanada. De um qualquer evento que não seja num centro comercial ou numa discoteca. De não ver a página de site bloqueado dos EAU cada vez que me esqueço e abro o flickr. De um bar que não pare de servir bebidas ás 2h30m... enfim, de uma série de coisas que não existem aqui, mas que penso tornariam esta terra muito mais agradável para quem aqui passa algum tempo. Penso que existem condições para o fazer e espero que mais ou menos rapidamente isso aconteça. Tenho no entanto a impressão de que já não será no tempo que aqui passarei. A luta contra o tédio continua.

Eid Mubarak! :)